Prosseguiram nesta quarta-feira (26/11) as atividades do 3º Encontro de Negras, Negros, Indígenas e Quilombolas (ENNIQ) do SINASEFE. Além de realizarem nova manifestação nas ruas da capital, participantes do evento se envolveram no debate focado na reparação e no Bem Viver. A greve estudantil no IFB também teve espaço na programação, destacando a importância da luta conjunta de trabalhadoras(es) e estudantes.
O 3º ENNIQ reúne mais de 180 pessoas sindicalizadas vindas de todo país, tendo como tema central: “Corpo-Território, Vozes Coletivas na Luta por Reparação, Bem Viver e Contra o Marco Temporal“.
Manhã
As atividades matutinas do ENNIQ foram direcionadas à denúncia da Reforma Administrativa, numa manifestação nas proximidades da Câmara dos Deputados. Também foi iniciado o credenciamento das(os) participantes.
Tarde
O início do 3º ENNIQ foi marcado pela “mesa que abraça”, quando as(os) convidadas(os) saudaram as(os) participantes ressaltando a importância da luta antirracista e da realização do evento, especialmente junto da Marcha das Mulheres Negras. Participaram deste momento de saudação e abraço: Dandara Tonantzin (deputada federal do PT-MG), Lucas Barbosa (professor do IFB), Letícia Nascimento (Andes-SN), Lenilson Santana (Fasubra), Divaneide Basílio (deputada estadual do PT-RN), Zuleide Queiroz (deputada Estadual do PSOL-CE) e Flávia Cândida (secretária de políticas para as mulheres do SINASEFE).
Greve estudantil
Estudantes do IFB estão em greve nesta quarta-feira (26/11) e apresentaram um informe durante o 3º ENNIQ. Thomaz Cambraia, secretário geral do grêmio Voz do IFB, ressaltou que os(as) estudantes reivindicam, além da acessibilidade e a alimentação estudantil, o direito à permanência de fato nas instituições públicas de educação. Esther Cristiny de Alencar, coordenadora geral do Grêmio Voz do IFB, também comentou os desafios da comunidade estudantil do IFB.
Mesa de abertura
A mesa de abertura do 3º ENNIQ, contou com a presença de seis palestrantes, tendo como temática Por reparação e Bem Viver: corpo-território e ancestralidade em luta pela superação do capitalismo. Palestraram nesta etapa: Marcos Kaingang (integrante do Ministério dos Povos Indígenas – MPI), Marta Quintiliano (quilombola e antropóloga do TJ-GO), Hertz Dias (professor estadual no Maranhão), Letícia Nascimento (Andes-SN), Sérgio Pessoa (professor da UFOB) e Caetano Lima (sindicalizado do Sintef-PB).
Marcos Kaingang do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) destacou a conquista histórica da criação do Ministério e a necessidade de representatividade de minorias em todas as esferas de poder. Ele citou avanços na demarcação de terras e nas cotas para indígenas/quilombolas em concursos públicos. No entanto, o principal foco de sua fala foi o alerta sobre os desafios estruturais. Kaingang criticou o corte orçamentário (com pedido de R$ 1 bilhão reduzido para R$ 500 milhões) e a disputa de poder interna no governo federal. Ele convocou a militância a manter a pressão e a cobrança sobre o Estado, afirmando que a luta deve ser conjunta entre povos indígenas, quilombolas e negros para superar as limitações impostas pela política fiscal e pelo agronegócio.
Marta Quintiliano, da Coletiva Guiné de Mulheres Indígenas e Quilombolas, em sua fala trouxe uma perspectiva profundamente pessoal e ancestral sobre a militância, o acesso ao conhecimento, a luta por reconhecimento quilombola e a importância do autocuidado e do “aterramento” na comunidade para combater o adoecimento no ativismo. Ela destacou a luta pela identidade e o atraso no reconhecimento dos povos quilombolas no Brasil (formalizado apenas em 2023), contrastando com a importância ancestral e urbana dessas comunidades. Ela criticou a fragilidade das políticas de permanência nas universidades por serem de “governo, não de Estado”.
Hertz Dias, professor estadual e municipal no Maranhão, fez uma intervenção política e histórica vigorosa, argumentando que a política de reparação histórica deve ser entendida como uma correção estrutural e profunda contra o capitalismo, e não apenas como medidas pontuais ou pecuniárias. Para ele, a verdadeira reparação exige a suspensão do pagamento da dívida pública e a realização de Reforma Agrária, da titulação quilombola e da demarcação das terras indígenas. Hertz denunciou o Banco do Brasil e a Caixa como financiadores históricos da escravidão e criticou a PEC 27/2024, afirmando que ela não pode ser considerada reparação, pois o valor financeiro proposto seria irrisório (menos de um real por mês por pessoa) frente aos prejuízos causados pelo racismo.
Leticia Nascimento, dirigente do Andes-SN, desafiou a definição abstrata de “classe trabalhadora”, argumentando que a classe possui gênero, raça, orientação sexual e território. Ela criticou duramente setores da esquerda e sindicatos que utilizam o discurso da “unidade” para silenciar pautas feministas, negras e LGBTQIAPN+, tratando-as como secundárias ou divisivas. Identificando-se como travesti negra, Letícia recusou esse apagamento e defendeu a interseccionalidade como ferramenta essencial de análise, lembrando que a acumulação de capital na América Latina se sustentou no trabalho doméstico não pago das mulheres e na mão de obra escravizada.
Sergio Pessoa, da UFOB, analisou o colonialismo como uma técnica de governo que, aliada ao capitalismo, visa o apagamento da identidade indígena. Ele destacou o conceito de “pardo” como uma estratégia histórica de desindienização e camuflagem nas estatísticas oficiais. O palestrante defendeu a Indianização (auto-reconhecimento e resistência) e o novo constitucionalismo latino-americano que incorpora o direito ao Bem Viver (incluindo direitos não humanos). Ele ressaltou o marco jurídico da ADPF 709, que garantiu legitimidade às organizações indígenas no STF e superou o antigo regime de tutela.
Caetano Lima, sindicalizado do SintefF-PB, de ancestralidade indígena e cigana, fez um relato histórico da violência e tutela social sofridas pelo povo cigano na Paraíba (como a permissão de ir ao centro da cidade apenas uma vez por semana). Ele destacou a luta contra o estigma de “ladrões e prostitutas” e a conquista de moradia e, sobretudo, o avanço na educação. A maior vitória recente foi a garantia de inclusão no IFPB Campus Sousa com a reivindicação de concurso para professores que respeitem a cultura cigana, assegurando que as crianças aprendam o currículo tradicional sem perder sua tradição.
Participantes também apresentaram suas contribuições ao debate da Mesa de abertura do ENNIQ, ressaltando suas histórias, pesquisas e percepções sobre a temática. Veja registros fotográficos:
Sinasefinho
Programação dos próximos dias
3º dia – quinta-feira (27/11)
- 9 horas – Mesa – Povos tradicionais em combate às mudanças climáticas: A luta contra o marco temporal, titulação das terras quilombolas e territorialidades ciganas
- Convidados: Raquel Tremembé (liderança indígena), Ìyá Marli Ògún Méjire (técnica-administrativa do Colégio Pedro II), Said Tenório (vice-presidente do Instituto Brasil-Palestina) e Sandra Braga (coordenadora executiva da Conac)
- 12 horas – Intervalo de almoço
- 14 horas – Mesa – Atravessamentos de classe, raça, gênero, etnia, sexualidade e deficiências na Rede Federal e nas IFEs ligadas ao Ministério da Defesa
- Convidados: Crystyna Tapuya Tayraryú (secretária de formação política e relações sindicais do SINASEFE), Marcelo Teixeira (Seção Sindical CMR e Eampe-PE), Maria Socorro da Silva (professora do IFRN) e Evaldo Gonçalves (secretário de políticas étnico-raciais do SINASEFE)
- 17h30min – Momento sabores de resistência
- 19 horas – Mesa – Balanço do 2º ENNIQ e dos GTs do 2º ENNIQ
- Mediadora: Kati Tupinambá (professora do IFMA)
- Convidados: Ìyá Marli Ògún Méjire (técnica-administrativa do Colégio Pedro II), Áubio Aurélio da Rocha Ferreira (Seção Sindical Concórdia-SC), Sônia Lamego Lino (Seção Sindical Litoral-SC) e Silvia Domingos (Seção Sindical IFSC-SC)
4º dia – sexta-feira (28/11)
- 8 horas – Informes do 3º ENNIQ
- Com: Milena Silva (secretária de comunicação do SINASEFE) e Sônia Regina Adão (Seção Sindical IFSC-SC)
- 9 horas – Sinasefinho
- 9h30min – Grupos de Trabalho (GTs)
- GT 1 – Polinizando o Bem Viver: Diálogos entre os movimentos negro, indígena, quilombola e cigano contra a hegemonia
- GT 2 – Colocando a interseccionalidade no centro do debate: Gênero, Raça, Classe, Etnia, Deficiência
- GT 3 – Análise, Perspectivas e Propostas sobre Racismo Institucional, Educação Antirracista e o Marco Temporal nas Bases do SINASEFE
- 12 horas – Intervalo de almoço
- 14 horas – Plenária Final (início)
- 17h30min – Momento sabores de resistência
- 18 horas – Plenária Final (continuação)
5º dia – sábado (29/11)
- 7 horas – Atividade Cultural – Visita ao Quilombo Mesquita
- Concentração: local a ser informado durante o 3º ENNIQ
- 9 horas – Chegada ao Quilombo Mesquita
- 9h30min – Abertura: Apresentação do grupo de dança cultural de catira
- 10 horas – Apresentação dos visitantes
- 11 horas – Passeio no Quilombo Mesquita
- Hortas de agricultura familiar, Igreja e apresentação do espaço
- 13 horas – Almoço
- Sucos e oficina de doce de marmelo feito na hora (tradição de 150 anos de resistência)
- 15 horas – Retorno
Com informações do SINASEFE Nacional




